Dano Moral em Ricochete na Justiça do Trabalho: Análise do IRR 181 do TST

DIREITO DO TRABALHO

Marcos Gabriel de Oliveira Rezende

7/30/20254 min read

a triangle shaped sign on a yellow wall
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Introdução

O dano moral, no âmbito do Direito do Trabalho, refere-se à lesão a bens imateriais do trabalhador, como sua honra, imagem, intimidade, vida privada, entre outros. Contudo, em situações mais graves, como acidentes de trabalho fatais, o sofrimento e o abalo emocional não se restringem apenas à vítima direta. Nesses casos, surge a figura do dano moral em ricochete, também conhecido como dano moral indireto ou reflexo, que atinge pessoas ligadas afetivamente à vítima.

Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) consolidou um importante entendimento sobre o tema por meio do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo (IRR) nº 181-64.2017.5.06.0171. Este artigo tem como objetivo analisar os efeitos jurídicos dessa tese, suas implicações para o Direito do Trabalho e a proteção dos familiares de empregados vítimas de acidentes fatais.

O Dano Moral em Ricochete

O dano moral em ricochete ocorre quando a lesão sofrida por uma pessoa afeta indiretamente terceiros, que, por sua vez, também experimentam um abalo moral significativo em decorrência do evento danoso. No contexto trabalhista, isso é particularmente relevante em acidentes de trabalho que resultam em morte ou lesões graves, onde o sofrimento se estende aos familiares da vítima.

O IRR 181 do TST e a Presunção Relativa do Dano

O IRR 181 do TST fixou, com eficácia vinculante, a seguinte tese jurídica:

“É devida indenização por dano moral em ricochete (indireto ou reflexo), por presunção relativa, aos integrantes do núcleo familiar (filhos, genitores, irmãos e cônjuge ou companheiro) de empregado que é vítima fatal de acidente de trabalho.”

Essa tese consolida o entendimento majoritário da Corte de que, em casos de acidente de trabalho com resultado morte, o empregador tem o dever de indenizar não apenas o dano direto à vítima (se houvesse sobrevivência), mas também os danos morais indiretos suportados pelos familiares. A grande inovação e relevância do IRR 181 reside na presunção relativa do abalo moral.

Isso significa que os familiares listados (filhos, genitores, irmãos e cônjuge ou companheiro) não precisam comprovar especificamente o sofrimento ou o abalo moral para ter direito à indenização. A existência do dano é presumida dentro dos limites do núcleo familiar definido. Essa presunção inverte o ônus da prova, cabendo ao empregador produzir provas em sentido contrário para afastar a obrigação reparatória. Na prática, isso confere maior objetividade e celeridade ao reconhecimento do dano reflexo.

Fundamentação Legal e Implicações Práticas

A natureza do entendimento firmado pelo IRR 181 encontra amparo em diversos dispositivos legais, como o artigo 927 do Código de Processo Civil (que trata da responsabilidade civil), o artigo 896-C da CLT (que disciplina os incidentes de recursos repetitivos), o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal (que assegura o direito à indenização por dano moral decorrente de acidente de trabalho) e os artigos 186 e 927 do Código Civil (que tratam do ato ilícito e da obrigação de reparar o dano).

A aplicação da tese, contudo, deve respeitar os pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, exigindo a presença de nexo de causalidade entre a conduta (omissiva ou comissiva) do empregador e o evento danoso. Ou seja, ainda que o dano seja presumido, a culpa do empregador pelo acidente deve ser comprovada.

Para as empresas, o IRR 181 possui relevância prática significativa, especialmente em setores de alta periculosidade ou insalubridade. Ele impõe aos empregadores o dever de adotar políticas robustas e contínuas de prevenção de acidentes, com rigorosa observância às Normas Regulamentadoras (NRs) e à legislação previdenciária e acidentária. O não cumprimento dessas obrigações pode resultar em responsabilização ampliada.

Em termos processuais, o reconhecimento da presunção relativa facilita a instrução probatória e pode elevar os valores indenizatórios arbitrados, considerando a possibilidade de pluralidade de beneficiários legítimos. Cada membro do núcleo familiar pode postular indenização individual, desde que atendidos os requisitos subjetivos da legitimidade e da vinculação afetiva presumida.

Impacto Institucional e Recomendações

A fixação da tese no IRR 181 está alinhada à política do TST de construir um sistema sólido de precedentes vinculantes, visando à redução da litigiosidade, à racionalização da atividade jurisdicional e à estabilização da jurisprudência. Essa medida é essencial para a missão constitucional uniformizadora do Tribunal, especialmente diante do grande volume de recursos processados anualmente.

Diante da consolidação desse entendimento, recomenda-se que as empresas promovam revisões periódicas de seus programas de segurança do trabalho, com análise sistemática de riscos, capacitação preventiva dos empregados e registros formais de fiscalização das condições ambientais. Os departamentos de recursos humanos devem estar atentos à possibilidade de responsabilização ampliada em demandas envolvendo óbito do trabalhador, adotando estratégias de mitigação de passivo e avaliação criteriosa de acordos extrajudiciais.

Conclusão

A tese do IRR 181 do TST representa um avanço significativo na proteção dos direitos dos familiares de vítimas de acidentes de trabalho fatais. Ao estabelecer a presunção relativa do dano moral em ricochete, o TST não apenas reforça o princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção integral à família, mas também eleva o patamar de responsabilização civil no âmbito juslaboral. Isso exige uma postura proativa, preventiva e tecnicamente estruturada por parte das organizações empresariais que atuam sob risco ocupacional elevado, contribuindo para um ambiente de trabalho mais seguro e justo.